sexta-feira, 22 de junho de 2012

parnaso

às meninas, Golda e Dulce



Arte: Isa de Oliveira

"Sou feminina, menina, mulher, a vida me ensina, a vida me é sina, sou fêmea, sou fama, sou filha, sou drama, da vida, oficina, sou tudo que rima, sou quem desatina, sou sina maior."
(autor desconhecido)


salve
os poetas...

esses seres
insuportavelmente
caóticos

e belos

... prefiro, porém
as poetisas.

henrique magalhães
(todos os direitos reservados)

terça-feira, 5 de junho de 2012

procissão (ou jesus no xadrez), por cordel do fogo encantado

O Cordel do Fogo Encantado foi, sem dúvida alguma, um dos grupos mais representativos da nova geração da chamada "música de raíz" do nordeste.
Oriundo da cidade de Arco Verde, portal do sertão pernambucano (terra de meu pai e quase vizinha de minha querida terra natal, Salgueiro), o grupo misturava música, teatro e recitais de cordéis e poesias de legítimos representantes da cultura sertaneja nordestina, como Zé da Luz e Chico Pedrosa. Aliás, é desse último a poesia interpretada pelo grupo no vídeo abaixo. Uma belíssima interpretação de uma obra-prima da cultura popular do nordeste brasileiro.
O Cordel do Fogo Encantado encerrou suas atividades há dois anos, ou pelo menos entrou em recesso por tempo indeterminado, para que seus integrantes se dedicassem a projetos pessoais. Quanto ao grande poeta paraibano Chico Pedrosa, fica a dica.
Apreciem sem moderação!



No tempo em que as estradas eram poucas no sertão
Tangerinos e boiadas cruzavam a região entre volante e cangaço
Quando a lei era do braço do jagunço pau mandando do coronel invasor
Dava-se no interior esse caso inusitado
Quando o palmera das antas pertencia ao capitão Justino Bento da Cruz
Nunca faltou diversão vaquejada, canturia, procissão e romaria
sexta-feira da Paixão
Na quinta-feira maior Dona Maria das Dores no salão paroquial
Reunia os moradores depois de uma pré-eleção ao lado do capitão
Escalava a seleção de atriz e atores
Todo ano era um Jesus, um Caífaz e um Pilatos
Só nao mudavam a cruz, o verdúguio e os mal-tratos
O Cristo daquele ano foi o Quincas Beija-Flor
Caífaz foi Cipriano
Pilatos foi Nicanor
Duas cordas paralelas separava a multidão
Pra que pudessem entre elas caminhar a procissão
Quincas conduzindo a cruz
Foi e num foi advertia, um cinturião pervesso que com força le batia
Era pra bater maneiro, Bastião não entendia
Devido um grande pifão que tomou naquele dia do vinho que o capelão guardava na sacristia
Cristo dizia: "ô rapaz, ve se bate devagar, já to todo encalombado assim não vou aguentar,
ta com a gota pra duer, ou tu para de bater ou a gente vai brigar jogo ja essa cruz fora, to ficando aperriado, vou morrer antes da hora de ficar crucificado"
O pior é q o malvado fingia que não ouvia e além de bater com força ainda se divertia, espiava pra jesus, fazia pouco e dizia:
"que Cristo froxo é você que chora na procissão? Jesus pelo que se sabe num era mole assim não eu to batendo com pena, tu vai ver o que é bom, na subida da ladeira da venda de fenelon o couro vai ser dobrado
até chegar no mercado da cuica mudotor"
Naquele momento ouviu-se um grito na multidao era Quincas que com raiva sacudiu a cruz no chão e partiu feito um maluco pra cima de Bastião
Se travaram num tabefe, pontapé e cabeçada
Madalena levou queda
Pilatos levou pancada
Deram um cacete em Caífaz que até hoje não faz nem sente gosto de nada
Dismancharam a procissão o cacete foi pesado
São Tomé levou um tranco que ficou desacordado
Acertaram um cocorote na careca de Timotéo que inté hoje é aluado
Inté mesmo São José que não é de confusão, na ansia de defender o seu filho de criação aproveitou a garapa pra dar um monte de tapa na cara do bom ladrão
A briga só terminou quando o doutor delegado interviu e separou cada santo pro seu lado
Desda que o mundo se fez, foi essa a primeira vez que Jesus foi pro xadrez mas não foi crucificado.


Chico Pedrosa

sexta-feira, 1 de junho de 2012

Chifre: Modo de Usar, por Xico Sá

Descobri esse texto, interessantíssimo, futucando um dos blogs o qual eu costumo seguir com uma relativa regularidade, assinado pelo jornalista e cronista cearense Xico Sá (http://xicosa.blogfolha.uol.com.br/).
Trata-se de uma reflexão bem-humorada e sem "frescuras" sobre uma das questões mais discutidas e também mais témidas (principalmente por nós, "homens com H"): o chifre.
Enfim: quem nunca levou (ou pelo menos não sabe que já levou)?
A todos e a todas, uma inquietante leitura!



Como assim corno de si mesmo?
É possível?
Como aprendi, entre outras tantas lições, com o meu conterrâneo Miguel Arraes: “Meu filho, tudo é possível no mundo dos possíveis”. Era uma coletiva no Palácio do Campo das Princesas. Jovem repórter, havia feito uma pergunta imbecil qualquer.

É possível ser corno de si mesmo? Sim. Está ai o Marques de Sade, um dos padrinhos sentimentais deste blog, que não nos deixa mentir.

Cuidado. É mais possível do que o amigo e a amiga imaginam.
Digamos que você vá a uma baile de máscaras. E lá esteja, sem que o saiba, seu marido ou a sua mulher. Você transa sem saber que é ele(a).

Eis a pista. Mais eu não conto para não estragar de tudo a leitura deste conto genial. Havia sido lançado pela Hedra, agora volta em uma edição para lá de econômica, apenas cinco mangos, na coleção de banca da L&PM.
Coleçãozinha excelente da editora de Porto Alegre. São livros de até 64 páginas, contos ou pequenos ensaios. Ideais para ler no metrô, em uma ponte aérea, no consultório.

Bela iniciativa no país dos livros caros e dos homens baratos.
“O corno de si mesmo” é da série de textos que o nobre Marquês escreveu quando estava preso na Bastilha, por volta de 1787, na França.

De si mesmo ou de outrem, amigo, algum dia faltamente seremos. Por isso o valor dessa literatura para refletir e coçar a testa. Eu recomendo.
Não há nada demais nisso. Seja você manso, complacente, quase um voyeur do chifre, como muitos personagens de Sade. Seja você um corno bravo, destemido, do tipo que sai a fazer besteiras. Inúteis besteiras. Chifre posto, nada mais nessa vida o subtrai.

Sim, caro Marçal Aquino, o amor e outros objetos pontiagudos. Acontece nas melhores famílias da Inglaterra ou do Crato.
Só um chifre, aliás, humaniza um macho. Só um chifre tira a nossa arrogância falocrática.

E já que falamos de filosofia de pára-choque, fica aqui um clássico: chifre é para homem, boi usa de enxerido.
Relaxa.


Xico Sá
(Jornalista, colunista da Folha de São Paulo)